E tudo o que é bom tem fim! No
ciclismo também. As corridas de um dia, muitas delas chamamos clássicas,
terminam hoje com a 105ª edição da Liège-Bastogne-Liège e os seus 256km. É o
quarto Monumento do ano e a mais antiga das 5 provas. Por isso o seu apelido é
“La Doyenne” ou seja, a mais antiga. Bem não é de todo verdade pois na parte
final da época ainda teremos Il Lombardia, mas a LBL marca o fim das corridas
de um dia e o início das grandes voltas por etapas.
Corre-se na região belga das
Ardenas e aqui os muros em pavê desaparecem e dão lugar a subidas curtas, duras,
mas bem pavimentadas. Já aqui o dissemos várias vezes mas a verdade é esta: enquanto
os flamengos, mais pobres, pavimentaram as estradas com pedras, os valoēs ,
mais ricos , escolheram o alcatrão . Para a Valónia melhores estradas para a
Flandres mais ídolos das 2 rodas. Nos paralelos fazem se homens e não é por
acaso que a grande maioria dos nomes belgas mais importantes são todos flemish.
Isto vem de pequenino: Rick van Looy , Eddy Merckx, Roger de Vlaemink, Museew ,
Boonen e Avermat. Só há uma excepção : Phillipe Gilbert é valão e natural da
zona da subida mais mítica da prova : la Redoute.
A edição de 1980 ficou para
sempre conhecida como “Neige-Bastogne-Neige”: neve-Bastogne-neve. De início
ao fim toda a prova ficou marcada por uma forte tempestade de neve e
temperaturas glaciares. Dos 174 ciclistas que partiram em Liège apenas 21 conseguiram
regressar e o primeiro a cortar a meta foi Hinault depois de atacar a 80km da
meta seguindo sozinho pelas estradas cobertas de neve. O ataque e a fuga de
Hinault foram tão poderosos que o francês ganhou com uma vantagem de 10 minutos
para o segundo classificado. Este dia
ficou marcado em Bernard Hinault e não apenas pelos melhores motivos . Sofreu
queimaduras pelo frio em dois dedos da mão direita e apenas conseguiu voltar a
fazer os movimentos normais três semanas depois. Aqueles dois dedos ficaram para
sempre debilidados.
Hinault , LBL 1980 |
La Côte de la Redoute: território de Phillipe Gilbert |
A La Redoute e os seus 2,4km a
9,8% de média foram introduzidos na LBL em 1975 e depressa começou a ser palco
dos melhores e mais emotivos confrontos entre os ciclistas. Mas nenhum desses
confrontos foi tão sangrento e violento como aquele que ocorreu naquela zona
durante dois dias de setembro em 1774 quando os revolucionários franceses
lutaram contra o exército imperial austríaco.
Monumento a assinalar a batalha de 1774 |
A pequena fortificação construída
como último reduto de defesa deu lugar ao nome de batismo daquela “pequena”
colina: La Côte de la Redoute e dois seculos depois aqueles caminhos rurais tornaram-se
um dos percursos mais sagrados para a história do ciclismo.
Bernard Hinault na edição de
1980, já relatada anteriormente, seguia isolado e em plena La Redoute viu o seu
diretor desportivo aproximar-se com um pequeno lenço para lhe aquecer as mãos
dizendo a brincar que o francês parecia um yeti com um gorro vermelho na cabeça.
O Texugo não gostou e no seu jeito bem característico prontamente respondeu:
“Vai
à merda , ou sobe aqui para a bicicleta e pedala tu “ .
Não foi isso que aconteceu
porque Guimard continuou dentro do carro da equipa Renault e Hinault em cima da
bicicleta pedalando de volta até Liège.
Hinault e o seu gorro vermelho, LBL 1980 |
A edição de 2019
Há alterações importantes no
percurso da LBL 2019. O final regressa à cidade de Liége, substituindo Ans e os
seus últimos km em ligeira subida não categorizada. Mais importante que isso é
a eliminação nos km finais da Côte de Saint
Nicholas. A última dificuldade da corrida será a Cotê de La Roche-aux-Faucons a
15km da meta. Serão 1300 metros à média de 11%. Este é a última oportunidade
para fazer diferenças a subir, já que todo o percurso até ao final é em terreno
plano.
A prova deverá ser por isso
bem mais aberta que em anos anteriores. A Côte de La Redoute está a 37km de
Liége e nesse ponto é provável que um grupo de candidatos saia na frente.
E quem pode ganhar o 4º Monumento
da temporada?
Uma coisa é certa. Infelizmente
não será Peter Sagan nem Mathieu van der Poel. O eslovaco está num mau momento
de forma. As clássicas do pavê não foram aquilo a que estamos habituados e as
Ardenas tem sido terríveis para o tri campeão do mundo. Sagan desistiu na Amstel
Gold Race e também na Fleche Wallonne. Numa temporada em que assumiu que um dos
objetivos seria a “Semana das Ardenas”, especialmente, a prova de amanhã, as prestações
de Sagan demonstram que algo correu mau na preparação ou que existem outros
problemas além dos desportivos. Problemas intestinais antes do Tirreno Adriático
não justificam as prestações da maior figura do ciclismo especialmente em
provas onde, mesmo não ganhando, dominava as corridas e era a principal figura
do pelotão. Se a sua forma não é a desejada, fez bem em não se apresentar na
linha de partida em Liége. O descanso previsto até à sua próxima prova, a Volta
a Califórnia, será decisivo para Sagan preparar a próximo grande objetivo
depois de falhada a temporada das clássicas: a camisola verde do Tour de
France. Peter Sagan precisa de vitórias e os adeptos de ciclismo precisam de um
Peter Sagan “à antiga” , que seja sinomino de emoção e espetáculo.
Espetacular e épica foi a vitória
de Mathieu van der Poel na Amstel Gold Race. Depois do vi vimos só desejávamos que
Poel fosse presença em todas as provas de ciclismo até ao final do ano. É impossível.
A sua Corendus- Circus não teve convite para a LBL e além disso o holandês
prepara-se para assaltar a taça do mundo de BTT.
Mesmo com Sagan e Poel , um
dos principais candidatos a vencer seria sempre o francês Julian Alaphilippe. O
ciclista da Deceuninck Quick-Step pode juntar à Milano-SanRemo o seu segundo Monumento.
Se a história se repetir Alaphilippe terá como principal rival o Jakob Fulgslang.
Os dois tem mantido uma rivalidade pouco habitual nas corridas de um dia sendo
que o francês tem ganho sempre ao ciclista dinamarquês.
Com um percurso teoricamente
mais acessível e onde as dificuldades da parte final foram reduzidas, a corrida
será muito aberta e os candidatos em número maior.
Michael Matthews nunca ganhou um
Monumento, o melhor que fez foi um terceiro lugar na Milano-SanRemo de 2015,
mas é um dos principais candidatos a discutir a corrida. Também Michał
Kwiatkowski pode vencer a LBL. O polaco não tem a favor os km finais do percurso,
mas é bem capaz de ser um dos atacantes do dia quando a corrida estiver na sua
fase mais complicada ao passar pela La Redoute. O mesmo para homens como o super
Philippe Gilbert, Tim Wellens, Tom Dumoulin ou Daniel Martin.
A participação portuguesa está
a cargo de Rui Costa e José Gonçalves.
LBL 2019 |
Startlist: aqui
Percurso: aqui
Transmissão TV : às 13h00
Eurosport 1
Hastag: #LBL #LBL2019 #LBL19
Boas pedaladas
AT
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