sábado, 27 de abril de 2019

Liège-Bastogne-Liège: o adeus às clássicas da Primavera.


 
E tudo o que é bom tem fim! No ciclismo também. As corridas de um dia, muitas delas chamamos clássicas, terminam hoje com a 105ª edição da Liège-Bastogne-Liège e os seus 256km. É o quarto Monumento do ano e a mais antiga das 5 provas. Por isso o seu apelido é “La Doyenne” ou seja, a mais antiga. Bem não é de todo verdade pois na parte final da época ainda teremos Il Lombardia, mas a LBL marca o fim das corridas de um dia e o início das grandes voltas por etapas.

Corre-se na região belga das Ardenas e aqui os muros em pavê desaparecem e dão lugar a subidas curtas, duras, mas bem pavimentadas. Já aqui o dissemos várias vezes mas a verdade é esta: enquanto os flamengos, mais pobres, pavimentaram as estradas com pedras, os valoēs , mais ricos , escolheram o alcatrão . Para a Valónia melhores estradas para a Flandres mais ídolos das 2 rodas. Nos paralelos fazem se homens e não é por acaso que a grande maioria dos nomes belgas mais importantes são todos flemish. Isto vem de pequenino: Rick van Looy , Eddy Merckx, Roger de Vlaemink, Museew , Boonen e Avermat. Só há uma excepção : Phillipe Gilbert é valão e natural da zona da subida mais mítica da prova : la Redoute.
 
 
 
Muitas foram as histórias de uma corrida já centenária, mas provavelmente uma das mais marcantes foi aquela edição ganha pelo ciclista que um dia disse: “eu odeio as clássicas belgas! Estamos a falar do Texugo, aquele “animal” que ganhou 5 voltas a França, 3 Giros de Italia, 2 voltas a Espanha, foi campeão do mundo e ganhou quase todas as grandes clássicas com exceção da Milano-SanRemo e da Ronde van Vlaanderen. Já sabem de quem falamos? Sim? Pois, Monsieur Bernard Hinault. E tudo aconteceu em 1980.
A edição de 1980 ficou para sempre conhecida como “Neige-Bastogne-Neige”: neve-Bastogne-neve. De início ao fim toda a prova ficou marcada por uma forte tempestade de neve e temperaturas glaciares. Dos 174 ciclistas que partiram em Liège apenas 21 conseguiram regressar e o primeiro a cortar a meta foi Hinault depois de atacar a 80km da meta seguindo sozinho pelas estradas cobertas de neve. O ataque e a fuga de Hinault foram tão poderosos que o francês ganhou com uma vantagem de 10 minutos para o segundo classificado.  Este dia ficou marcado em Bernard Hinault e não apenas pelos melhores motivos . Sofreu queimaduras pelo frio em dois dedos da mão direita e apenas conseguiu voltar a fazer os movimentos normais três semanas depois. Aqueles dois dedos ficaram para sempre debilidados.  
Hinault , LBL 1980


 

 
Na Liège-Bastogne-Liège, tal como nos outros quatro Monumentos, também temos uma troço/subida que marca a história da própria corrida. Se na Milano-SanRemo temos a Cipressa ou o Poggio di SanRemo, na Ronde van Vlaanderen o Koppenberg (já aqui falamos) e o Kapelmuur (também, aqui) , no Paris-Roubaix o Troueé de Arenberg e na Il Lombardia o Muro di Sormano, na prova das Ardenas temos a subida com nome de revista de moda: La Côte de la Redoute.

 
La Côte de la Redoute: território de Phillipe Gilbert


A La Redoute e os seus 2,4km a 9,8% de média foram introduzidos na LBL em 1975 e depressa começou a ser palco dos melhores e mais emotivos confrontos entre os ciclistas. Mas nenhum desses confrontos foi tão sangrento e violento como aquele que ocorreu naquela zona durante dois dias de setembro em 1774 quando os revolucionários franceses lutaram contra o exército imperial austríaco.
Monumento a assinalar a batalha de 1774
A pequena fortificação construída como último reduto de defesa deu lugar ao nome de batismo daquela “pequena” colina: La Côte de la Redoute e dois seculos depois aqueles caminhos rurais tornaram-se um dos percursos mais sagrados para a história do ciclismo.

 
Bernard Hinault na edição de 1980, já relatada anteriormente, seguia isolado e em plena La Redoute viu o seu diretor desportivo aproximar-se com um pequeno lenço para lhe aquecer as mãos dizendo a brincar que o francês parecia um yeti com um gorro vermelho na cabeça. O Texugo não gostou e no seu jeito bem característico prontamente respondeu:
“Vai à merda , ou sobe aqui para a bicicleta e pedala tu “ .
Não foi isso que aconteceu porque Guimard continuou dentro do carro da equipa Renault e Hinault em cima da bicicleta pedalando de volta até Liège.
Hinault e o seu gorro vermelho, LBL 1980
 
 
A edição de 2019
 
Há alterações importantes no percurso da LBL 2019. O final regressa à cidade de Liége, substituindo Ans e os seus últimos km em ligeira subida não categorizada. Mais importante que isso é a eliminação nos km finais da Côte de Saint Nicholas. A última dificuldade da corrida será a Cotê de La Roche-aux-Faucons a 15km da meta. Serão 1300 metros à média de 11%. Este é a última oportunidade para fazer diferenças a subir, já que todo o percurso até ao final é em terreno plano.
A prova deverá ser por isso bem mais aberta que em anos anteriores. A Côte de La Redoute está a 37km de Liége e nesse ponto é provável que um grupo de candidatos saia na frente.
E quem pode ganhar o 4º Monumento da temporada?
Uma coisa é certa. Infelizmente não será Peter Sagan nem Mathieu van der Poel. O eslovaco está num mau momento de forma. As clássicas do pavê não foram aquilo a que estamos habituados e as Ardenas tem sido terríveis para o tri campeão do mundo. Sagan desistiu na Amstel Gold Race e também na Fleche Wallonne. Numa temporada em que assumiu que um dos objetivos seria a “Semana das Ardenas”, especialmente, a prova de amanhã, as prestações de Sagan demonstram que algo correu mau na preparação ou que existem outros problemas além dos desportivos. Problemas intestinais antes do Tirreno Adriático não justificam as prestações da maior figura do ciclismo especialmente em provas onde, mesmo não ganhando, dominava as corridas e era a principal figura do pelotão. Se a sua forma não é a desejada, fez bem em não se apresentar na linha de partida em Liége. O descanso previsto até à sua próxima prova, a Volta a Califórnia, será decisivo para Sagan preparar a próximo grande objetivo depois de falhada a temporada das clássicas: a camisola verde do Tour de France. Peter Sagan precisa de vitórias e os adeptos de ciclismo precisam de um Peter Sagan “à antiga” , que seja sinomino de emoção e espetáculo.
Espetacular e épica foi a vitória de Mathieu van der Poel na Amstel Gold Race. Depois do vi vimos só desejávamos que Poel fosse presença em todas as provas de ciclismo até ao final do ano. É impossível. A sua Corendus- Circus não teve convite para a LBL e além disso o holandês prepara-se para assaltar a taça do mundo de BTT.
Mesmo com Sagan e Poel , um dos principais candidatos a vencer seria sempre o francês Julian Alaphilippe. O ciclista da Deceuninck Quick-Step pode juntar à Milano-SanRemo o seu segundo Monumento. Se a história se repetir Alaphilippe terá como principal rival o Jakob Fulgslang. Os dois tem mantido uma rivalidade pouco habitual nas corridas de um dia sendo que o francês tem ganho sempre ao ciclista dinamarquês.
Com um percurso teoricamente mais acessível e onde as dificuldades da parte final foram reduzidas, a corrida será muito aberta e os candidatos em número maior.
Michael Matthews nunca ganhou um Monumento, o melhor que fez foi um terceiro lugar na Milano-SanRemo de 2015, mas é um dos principais candidatos a discutir a corrida. Também Michał Kwiatkowski pode vencer a LBL. O polaco não tem a favor os km finais do percurso, mas é bem capaz de ser um dos atacantes do dia quando a corrida estiver na sua fase mais complicada ao passar pela La Redoute. O mesmo para homens como o super Philippe Gilbert, Tim Wellens, Tom Dumoulin ou Daniel Martin.
A participação portuguesa está a cargo de Rui Costa e José Gonçalves.
 
LBL 2019
 
 
Startlist: aqui
Percurso: aqui
Transmissão TV : às 13h00 Eurosport 1
Hastag: #LBL #LBL2019 #LBL19
Boas pedaladas
AT
 
 

 



 




 






 
 

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