quarta-feira, 27 de setembro de 2017

Gerbi il " Diavolo Rosso" : desistir para ganhar....!



Giovanni Gerbi: vencedor da 1º edição Giro Lombardia

 
Hoje  recuamos até 1905 para contar um pequeno mas importante episódio da primeira edição do Giro Lombardia .
A partida e a meta foram na capital da região: Milão e a distância 230km. Originalmente o Giro da Lombardia chamava-se Milão-Milão O " grande " vencedor foi Giovanni Gerbi, mais conhecido pelo " IL DIAVOLO ROSSO " e o nome não era apenas pela sua camisola encarnada. Gerbi tinha formas de ganhar corridas que não lembram ao diabo.


Conhecia como as palmas das mãos as estradas da região da Lombardía e isso foi fundamental para ser o primeiro ciclista a cortar a meta em 1905.
Várias são as teorias de como conseguiu ganhar a prova . Pierre Chany no seu livro “ A fabulosa história das grandes clássicas e dos campeonatos do mundo”  conta que foi mais ou menos assim!
 Ao conhecer o percurso exato, Giovanni sabia que a prova podia ficar decidida logo aos 30km. A essa quilometragem o pavimento estava em muito más condições existindo uma zona onde a estrada estreita até que só é possível passar um ciclista de cada vez. Este era o momento, era aqui que o “Diabo Vermelho” queria decidir a corrida. Não fez por menos. Gerbi , a 2km deste ponto , encosta para a berma e finge que desiste. O pelotão segue caminho até á armadilha. Enquanto todos se amontoam criando uma enorme confusão, Giovanni Gerbi faz um quilómetro de atalho em corta-mato , passa ao lado do pelotão e recomeça a pedalar uns metros á frente sem ninguém reparar . O tempo que os seus adversários demoraram a retomar a prova valeram a Giovanni uma importante vantagem. Os restantes 200km foram feitos em solitário erguendo os braços na meta em Milão com 40 minutos de vantagem.
 Mas está não é a única forma bizarra de ganhar associada Giovanni Gerbi. No ano seguinte, em 1906, no mesmo Giro da Lombardia, Gerbi é o primeiro a cruzar a meta. Desta vez não desistiu, mas entre outras diabruras fechou passagens de nível aos ciclistas que vinham atrás de si e até lançou pregos para o chão procurando furar os pneus adversários. A organização não foi na cantiga e o " Diabo Vermelho" Gerbi foi desclassificado. É castigado por 2 anos. Só que a sua popularidade junto dos adeptos e sobretudo o seu apelo de inocência reproduzido na Gazzetta dello Sport que valeram um record de mais de 100 mil copias vendidas, forçaram os organizadores das provas a reduzirem o seu castigo e o italiano pode voltar a correr no ano seguinte.
 
Fabrica de Bicicletas Gerbi em Asti
Giovanni Gerbi nasceu a 4 junho de 1885 em Asti , cidade do norte italiano n região de Piemonte. Foi um dos primeiros e mais importantes impulsionadores do ciclismo de competição em Italia. Além da vitória do Giro Lombardia em 1905 , Gerbi ganhou 3 Roma-Napoles-Roma, 1 giro Piemonte e 2 Milão-Torino. No Giro de Italia de 1911 foi 3º classificado.
Tal como todos os outros ciclistas não pedalou com a Primeira Guerra Mundial. Com o fim do conflito deixa o ciclismo de competição e dedica-se ao fabrico de bicicletas . Funda em 1920 , na sua cidade natal a Fabrica Gerbi .
 
Mais tarde volta a competir e em 1933 com 45 anos participa no Giro de Itália.
 
Il Diavolo Rosso , Giro Itália 1933
 
Morre num acidente de carro no regresso a Asti depois de ir visitar o seu amigo e rival de competição : Giovanni Rossignoli
Boas pedaladas
AT

sábado, 9 de setembro de 2017

Alto de Angliru : " Olimpo del Ciclismo "


O mítico Angliru !  
Mas o que faz uma subida que foi percorrida apenas 7 vezes em competição ser alvo de tanta adoração, curiosidade e respeito? A resposta é simples : a  sua dureza e a forma como foi descoberta fizeram com que  El Gamonal ( o outro nome ) figurasse nalgumas listas das ascensões  lendárias. É justo ? Veremos.
Vamos por partes, primeiro a geografia.
 
O Angliru fica situado no norte de Espanha , na região das Astúrias. No meio de uma vasta zona de pastagem. Os seus 1570m de altitude fazem parte do coração da serra de Aramo no concelho asturiano de Riosa. Quem tiver coragem para subir ao alto terá de se deslocar à aldeia de La Vega de Riosa. A subida ao “Olimpo do Ciclismo” começa aí…

El Angliru: serra de Aramo nas Astúrias

Mas porque é que a 1ª subida ao alto do Angliru apenas foi percorrida em competição em 1999? Pela mesma razão que as “montanhas “que só nós conhecemos nas nossas voltas de domingo raramente fazem parte da Volta a Portugal. Não são conhecidas.  O Angliru também não o era.  A primeira vez que se deu a conhecer ao mundo do ciclismo foi na edição de fevereiro de 1996 da revista espanhola “Ciclismo a Fundo” . Apartir daí a sua “vida” mudaria por completo.
O responsável pela sua descoberta foi Miguel Prieto, diretor de comunicação da Organização Nacional de Cegos Espanha ( ONCE) para sempre conhecido como o “ visionário cego “ . Prieto não fez por menos.  A 23 de setembro de 1997 escreveu uma carta (ver a carta)  aos responsáveis máximos da organização da Vuelta : Enrique Franco e Alberto Gadea. Tentava então convencê-los que a subida ao Angliru seria umas das mais espetaculares de sempre… Apenas conhecida por pastores locais que a utilizavam para movimentar o seu gado , agora que foi pavimentada não havia razões para não fazer parte do percurso. Para Prieto , se a Itália tinha o Mortirolo e a França o Mont Ventoux então a Espanha não podia ter “apenas “ os Lagos Covadonga. Tinha de ter algo mais difícil e duro. A resposta só podia estar em La Veja de Riosa e no seu Angliru.
Zona de pastagem de gado, El Gomonal nasceu para o ciclismo em 1999
 
Franco e Gadea acompanhados de Prieto fizeram o seu reconhecimento em 1998 e encontraram “ a misteriosa montanha asturiana. A mais dura subida jamais vista” . Passados 13 dias na apresentação da Vuelta a surpresa. Era oficial, o Angliru iria ser palco de um final de etapa. O mundo ciclístico tinha então os olhos postos neste monstro asturiano e as reações não se fizeram tardar. Um dos melhores trepadores de então, o italiano Leonardo Piepoli, visitou o Angliru uns dias antes do inicio da Vuelta 1999 e descobriu como “era impossível “ principalmente a zona de Cueña les Cabres e as suas rampas de 24% de inclinação . Outros críticos perguntavam o que queria a organização: “sangue ?”. Vicente Belda, diretor desportivo da equipa Kelme , estava indignado. “Como queriam um ciclismo limpo se depois os corredores subiam estas barbaridades …” antecipando-se ao escândalo de doping onde a sua equipa esteve envolvida anos mais tarde.
Cuenã les Cabres : rampas de 24% inclinação
 
José Maria Jiménez: primeiro vencedor no Alto de Angliru
Mas o grande momento chegou. A etapa ligava a cidade de Léon ao Alto do Angliru e num duelo digno de um filme de suspense o espanhol José Maria Jiménez bate o russo Pavel Tonkov sobre a linha de meta e torna-se o primeiro a conquistar El Gamonal. No final dedica a vitoria ao seu amigo Pantani : “ Nunca subi uma montanha tão dura. É exageradamente forte. Aqui Pantani e eu faríamos estragos “. Com apenas meses de diferença, no Inverno de 2003 a 2004, Pantani e Jiménez, dois dos trepadores mais talentosos da sua geração morriam de overdose de cocaína. Ao dar a noticia da morte de “ Chava “ Jiménez o jornal ABC escreveu “ El primer hombre en la luna ( o al menos en el Angliru )” .
 O Angliru regressou no ano seguinte ( 2000) e o seu vencedor foi o italiano Gilberto Simoni. O impacto da sua vitória no colosso espanhol foi tão grande que em Itália os responsáveis pelo Giro estavam desesperados para recuperar o título de “subida mais dura” que o Angliru tinha roubado ao Mortirolo. Como solução em 2003 incluíram no percurso do Giro de Itália o Monte Zoncolan e também o Col de Finestre com os seus famosos 8km em terra.
Mais 4 edições da Vuelta escalaram a subida: 2002 ( Roberto Heras) , 2008 ( Alberto Contador), 2011 ( Juan Cobo), 2013 ( Kenny Elissonde) e 2017 ( a ultima vitória de Alberto Contador ).
" El Olimpo de Ciclsmo" - Ayuntamiento de Riosa
El Gamonal ganhou fama , e La Veja de Riosa é hoje procurada por quem quer testar as suas capacidades físicas e mentais. Seja a pé ou de bicicleta todos aqueles que visitam a região de Riosa querem conquistar o “Olimpo do Ciclismo “ . A expressão é do Alcaide José Antonio Muñiz que viu na ascensão ao Angliru uma boa forma de promover o seu concelho. Será com certeza exagerada, mas na Serra de Aramo os argumentos esgotam-se tão rapidamente como as forças nas pernas e o ar nos pulmões quando temos pela frente rampas tao duras a ultrapassar os 20% de inclinação.
 
Se o Angliru fará parte do “ Olimpo do Ciclismo” ao lado do Mont Ventoux, Tourmalet, Izoard ou  Alpe D´Huez isso não sabemos . Precisa de muita coisa, principalmente de história. E também no ciclismo a história precisa de tempo e o Angliru ainda é muito novo.
Teremos hoje mais um capítulo rumo à lenda?
Desde La Vega de Riosa
Altitude : 1573m
Distancia: 12,5k
Desnível: 1266m
Média: 10,13%
Máxima: 23,5%
 
 
 
Boas pedaladas, AT